A rede fast-food de comida árabe mais conhecida no Brasil, Habib’s, surgiu da cabeça de um luso-brasileiro. Por trás dessa história de sucesso existe a dor e a superação de uma tragédia familiar que levaria o médico Antônio Alberto Saraiva a idealizar a democratização de uma culinária pouco explorada no país.
Filho de agricultores humildes, Antônio chegou ao Brasil com 6 meses de vida. A Freguesia do Ó (zona norte paulistana), foi a primeira morada da família de imigrantes portugueses no país. Mas foi em Santo Antônio da Platina, no norte do Paraná, onde o empreendedor cresceu e viveu até seus 17 anos.
Com o sonho de se tornar médico, ele decidiu retornar para a capital paulistana no seu último ano escolar. Levando uma vida humilde, encarava de seis a sete conduções por dia para frequentar o cursinho e a escola. Chegou a prestar vestibular por 2 anos em várias faculdades e não passou em nenhuma. Porém seu pai não deixou que desistisse, sempre incentivando Antônio a persistir no sonho, até que no terceiro ano, conseguiu passar em todas as faculdades que prestou. Nesse ano, seu pai havia assumido uma padaria no Belenzinho, antiga, de estrutura destruída e precária, porém com a esperança de transformá-la na melhor padaria da rua.
Uma tragédia, porém, se abateu sobre a família quando o pai foi assassinado durante um assalto. Foi Antônio que o encontrou morto na padaria, acarretando uma mudança radical e dolorosa em sua vida dali pra frente. Perdeu seus sonhos, sua crença em Deus e se viu obrigado a trancar a faculdade e assumir a padaria que o pai deixara.
Com dificuldades em administrar um local tão precário, sem estrutura de pessoal e sem clientes, o empresário quase desistiu da padaria que só dava prejuízo, até que um acontecimento o fez mudar de ideia. Ao pegar um táxi às 4h30 da manhã para ir à padaria como fazia rotineiramente, começou a lamentar-se com o taxista sobre o negócio e sobre a perda do pai. Porém, quando desceu do táxi, o que ouviu do motorista foi exatamente as mesmas palavras que seu pai lhe dizia na época do vestibular: “Não desiste, tem que caminhar, tem que dar um passo a mais.” Antônio, extremamente emocionado, compreendeu o recado como uma mensagem de Deus.
“Acho que a mobilidade social existe e está presente. Mas não é para todo mundo: o cara tem que ter um diferencial, garra, vontade, disposição, conhecimento, estudo.”
Aos 20 anos tomou a decisão de fazer a padaria dar certo, assim como era o sonho de seu pai, e assumiu o negócio colocando literalmente a mão na massa. Acompanhava de perto o trabalho do padeiro, aprendeu o ofício, e agindo pelo desespero, arriscou colocar o preço do pão 30% mais barato que o tabelado. Acabou descobrindo o segredo do volume de vendas e do sucesso de todos os negócios que viria a abrir: preço extremamente baixo mantendo a qualidade. A clientela aumentou consideravelmente junto com a melhoria da própria padaria, se tornando a melhor da rua.
Com o sucesso estabelecido, vendeu o estabelecimento e com o dinheiro investiu na montagem de vários outros negócios aplicando a mesma filosofia do preço, assim os estabelecimentos ficavam sempre lotados. Seu segredo era montar bons negócios e depois vendê-los. Durante esse período de prosperidade, mas também de muito trabalho, conseguiu se formar em medicina, porém a veia comercial em Antônio já era mais forte.
O Habib’s surgiria quando um senhor de 70 anos chamado Paulo Abud, apareceu pedindo a Antônio um trabalho. Ele havia sido um grande cozinheiro árabe na 25 de março, com grande habilidade para fazer Tabula, Homus, Quibe Cru, Coalhada, Kafta, Esfihas, etc. Antônio abraçou a oportunidade, e logo vislumbrou oferecer uma culinária árabe de forma acessível, já que na época era uma comida de nicho e cara. Decidiu dar o emprego para Abud e aprendeu toda a culinária árabe com ele.
Às vezes as pessoas é que não enxergam a oportunidade. Quem tem essas características tem condição de vencer, seja vendendo sorvete ou cachorro-quente na rua. Esse desejo de vencer na vida são diferenciais importantes.
O carro-chefe escolhido para o novo negócio foi a Esfiha. Já o nome Habib’s foi sugestão de um amigo de Antônio, de ascendência árabe. “Habib” é um termo carinhoso que significa “querido” ou “amado”. A primeira unidade do novo negócio foi aberta na Rua Cerro Corá, com um investimento de R$ 80 mil, em 1988, e inicialmente com apenas dez mesas. Durante mais de 40 dias havia fila na porta com as Esfihas custando 0,19 centavos de cruzados. O empreendedor continuou durante muito tempo acordando às 4h00 da manhã para fazer os produtos: pão, pizza, esfiha. Às 11h00 ia para o salão atender os clientes e a loja só fechava 00h.
Com a enorme aceitação pelo público e grande volume de vendas, em 3 anos foram abertas sete lojas próprias. Montou também uma cozinha central para garantir a padronização dos produtos, fazendo a distribuição para as suas, até então, 18 lojas abertas. Antônio decidiu entrar no esquema de franquias somente com a abertura da sua 19ª loja da rede.
Em 2018 o Habib’s completou 29 anos de existência, com mais de 400 lojas em quase todo o Brasil e 600 milhões de esfihas vendidas por ano. São mais de 25 mil funcionários e faturamento em torno de 2 bilhões de reais. A empresa investe em verticalização para ajudar a vender barato, contando com uma fábrica de sorvete que faz as sobremesas, uma indústria de pães, de água, e de queijo. E a Voxline (Call Center) que nasceu na necessidade do delivery.
Além da marca Habib’s, Antônio criou a marca Ragazzo. Inaugurada em 1991, em São Caetano do Sul, o espaço traz o mesmo conceito do árabe, oferecendo produtos de qualidade pelo menor preço possível. Mas agora essa receita de sucesso traz um molho especial: a tradição italiana de uma boa refeição.
Com almoços de segunda a segunda, depois de 15 anos de sucesso no ABC, o Ragazzo moderniza sua primeira loja e abre novas unidades. Em março foi inaugurado o Ragazzo Morumbi. Dois meses depois, foi a vez da loja Alameda Santos nos Jardins. Nesse mesmo ano, a empresa inicia sua operação como marca franqueada. Em 2007, coloca em funcionamento sua Central de Produção de 7 mil m² em Itapevi, na Grande São Paulo, e hoje já são mais de 100 lojas pelo Brasil.